MINISTRO OPINA SOBRE JULGAMENTO DE BOLSONARO – 16/9/2025

STF JULGA “SEM PAIXÃO, ÓDIO OU RANCOR, DIZ CELSO

Para ministro aposentado, “quem atentou

contra a democracia não é digno de perdão do Estado”.

Por Isadora Peron — De Brasília

15/09/2025 05h00 – Jornal “Valor Econômico”

Celso de Mello: não há identidade entre anistia de 1979 e discussão atual —

O ministro aposentado Celso de Mello, que encarnou como ninguém a figura de decano do Supremo Tribunal Federal (STF), afirma que a Corte julga “sem paixão, ódio ou rancor”. Para ele, a condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro e seus aliados por tentativa de golpe de Estado demonstra que o tribunal não se curva a pressões, sejam elas internas ou externas, nem se “intimida diante da fúria dos que desprezam a Constituição”.

Celso de Mello defende ainda que a aprovação de um projeto de anistia pelo Congresso seria um “novo e ultrajante vilipêndio” contra o Estado Democrático de Direito. Ele lembra que pesquisas demonstram que a ideia, capitaneada por pessoas próximas ao ex-presidente, não tem apoio da maioria da população. Também classifica a proposta como inconstitucional.

Fatos graves

“O julgamento revelou a extrema gravidade dos fatos, pois envolvem, entre outros crimes, a imputação de tentativa de ruptura da ordem constitucional e de organização criminosa armada, o que corresponde a dois dos mais sérios delitos em um Estado Democrático de Direito. Em situações críticas, o Tribunal sempre buscou preservar, com firmeza, a supremacia da Constituição e a prevalência da ordem democrática. Assim deve ser, porque a democracia – animada pelo sopro inestimável da liberdade – não pode tolerar os que buscam destruí-la.”

Julgamento sem paixão

“O STF sabe formar seu juízo sem paixão, sem ódio, sem rancor e sem concessões indevidas, pois nossa Suprema Corte não se curva a pressões (internas ou externas), não se submete a maiorias ocasionais nem se intimida diante da fúria dos que desprezam a Constituição. Esse é o compromisso inarredável do Tribunal com a Constituição e com a liberdade do cidadão.”

Suspeição de Moraes

“O ministro Alexandre de Moraes tem exercido sua função com observância dos limites constitucionais e legais, agindo como legítimo juiz da causa e não como parte nela envolvida. A Constituição não permite que a jurisdição se paralise pela simples insurgência dos acusados contra o magistrado que, agindo corretamente, aplica a lei.”

Cerceamento de defesa

“A Corte tem reiterado, ao longo de sua história, a absoluta necessidade de respeito ao contraditório e à ampla defesa. E é o que se observou no julgamento: as defesas foram regularmente admitidas, tiveram acesso aos autos e puderam exercer, em plenitude, seus direitos e garantias. O que não se admite é confundir a ampla defesa com a liberdade de instaurar incidentes para obstruir a jurisdição.”

Valores democráticos

“O STF analisou o processo da trama golpista com a independência, a isenção e a serenidade que a gravidade do caso exige. O julgamento reafirmou os valores do Estado de Direito, responsabilizando aqueles que, julgados culpados, atentaram contra a Constituição e as instituições republicanas. Com a condenação criminal dos réus, a Corte demonstra que não há espaço, no Brasil, para aventuras golpistas.”

Ninguém está acima da lei

“Não se trata apenas de julgar um episódio gravíssimo da história recente de nosso país: trata-se, sobretudo, de reafirmar que a democracia brasileira não transige com golpes, não se curva a tentações de retrocesso institucional nem tolera a ruptura da ordem constitucional. A Corte, fiel à sua missão institucional, demonstra à Nação que ninguém, absolutamente ninguém, está acima da Constituição ou das leis.”

Anistia em 1979

“A Lei de Anistia promulgada em 1979 surgiu em um contexto histórico de exceção, marcado pela repressão política e pela ausência de plenas liberdades públicas. Tratava-se de medida de caráter eminentemente político, concebida no âmbito de um regime ditatorial que buscava, por pressão da sociedade civil, administrar a transição para a normalidade democrática. Por essa razão, configurou-se como um ato de esquecimento estatal de infrações políticas e conexas, abrangendo, inclusive, crimes praticados não só por aqueles que se insurgiram contra a ditadura militar, mas, também, por agentes públicos no exercício da repressão.”

Anistia hoje

“Não há mínima identidade entre os dois momentos históricos: em 1979, a anistia foi expressão de um pacto político ditado por um regime de exceção. A equiparação entre ambas as situações é imprópria e conduz a graves equívocos hermenêuticos, mesmo porque, além de a proposta de anistia estar sofrendo forte rejeição popular, torna-se importante sempre relembrar que não deve haver perdão para quem atenta contra o regime democrático.”

Sem apoio

“Esses golpistas revelaram em seu comportamento criminoso sua verdadeira face: a de delinquentes e de pessoas retrógradas e reacionárias, que só buscam o retrocesso institucional, que prestam, em gestos de indigna submissão, reverência vergonhosa a todos os tipos de fundamentalismo e de negacionismo, que cultivam, cegamente, um ódio irracional, além de profundo grau de intolerância ao modelo de democracia constitucional, visando servir a um projeto sórdido de poder autoritário, visceralmente lesivo ao princípio dominante nas sociedades civilizadas: o princípio intocável da democracia. Essa é, certamente, a razão pela qual mais da metade do povo brasileiro tem manifestado sua contrariedade e oposição ao projeto de anistia ora em tramitação na Câmara dos Deputados.”

Projeto inconstitucional

“O projeto articulado pela oposição destinado a conceder anistia aos golpistas que dessacralizaram os símbolos da República e do regime democrático, representa, em sua essência, um novo e ultrajante vilipêndio contra o Estado de Direito e a supremacia da ordem constitucional. Entendo que tal pretensão encontra obstáculo na própria Constituição, pois se mostra inviável a concessão de anistia a quem perverte as instituições com o objetivo de dar golpe de Estado ou de abolir, mediante violência ou grave ameaça, o Estado Democrático de Direito. A proposta ofende postulados constitucionais protegidos por cláusulas pétreas.

Indignos de perdão

“Profanadores da República e conspurcadores da democracia, como todos aqueles que se envolveram na organização, na coordenação, no planejamento, no financiamento e na execução dos atos criminosos não são dignos nem passíveis de merecer esse benefício da clemência soberana do Estado.”

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