STF define 40 gramas de maconha como critério para diferenciar usuário de traficante

Foto: Ao fixar tese, Plenário decidiu que a substância pode ser apreendida, e o usuário poderá sofrer sanções de advertência e cumprimento de medidas educativas.

EDIÇÃO 2285 – 29-6-2024

        STF – O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) definiu nesta quarta-feira (26) a tese de repercussão geral do julgamento que descriminalizou o porte de maconha para consumo pessoal. Por maioria, o colegiado definiu que será presumido usuário quem adquirir, guardar, depositar ou transportar até 40 gramas de cannabis sativa ou seis plantas fêmeas.

        Ao avaliar o Recurso Extraordinário (RE) 635659, a maioria da Corte entendeu que o porte de maconha não é crime e deve ser caracterizado como infração administrativa, sem consequências penais. Assim, fica afastado, por exemplo, o registro na ficha de antecedentes criminais do usuário. As sanções, nesse caso, seriam advertência sobre os efeitos da maconha e comparecimento a programa ou curso educativo (incisos I e III do artigo 28 da Lei de Drogas) e aplicadas em procedimento não penal. Presunção relativa  –Ao longo da deliberação, os ministros frisaram que a quantidade de 40 gramas ou seis plantas fêmeas é relativa. A polícia está autorizada a apreender a droga e conduzir a pessoa à delegacia, mesmo por quantidades inferiores a esse limite, principalmente quando houver outros elementos que indiquem possível tráfico de drogas, como embalagem da droga, variedade de substâncias apreendidas, balanças e registros de operações comerciais. Nesse cenário, o delegado de polícia deverá justificar minuciosamente as razões para afastar a presunção de porte para uso pessoal e não poderá se remeter a critérios arbitrários, sob pena de responsabilização.

        O juiz responsável pelo caso também poderá, em casos de apreensão de quantias superiores a 40 gramas, afastar o enquadramento como crime, caso haja provas suficientes da condição de usuário da pessoa.

        Apelo – Os ministros também determinaram que o Conselho Nacional de Justiça, em articulação com o Executivo e o Legislativo, deve adotar medidas para o cumprimento da decisão, além de promover mutirões carcerários com a Defensoria Pública para apurar e corrigir prisões que tenham sido decretadas fora dos parâmetros determinados pelo Plenário.

        O colegiado ainda fez um apelo pelo aprimoramento de políticas públicas para o tratamento aos dependentes de drogas, com foco na não estagnação do usuário. “Ninguém no Supremo Tribunal Federal defende o uso de drogas. Pelo contrário, nós desincentivamos o uso de drogas. Drogas ilícitas são uma coisa ruim”, ressaltou o ministro Luís Roberto Barroso, presidente do STF. “Estamos debatendo a melhor forma de enfrentar esse problema e minimizar suas consequências para a sociedade. E constatamos que a não fixação de uma quantidade distintiva tem sido uma má política pública”.

        Segundo Barroso, a definição desse parâmetro para distinguir usuário de traficante vai evitar que o excesso de encarceramento “forneça mão de obra para o crime organizado nas prisões brasileiras”.

FATOS

        Trata-se de recurso extraordinário, com repercussão geral (Tema 506), em que se discute se a posse de pequenas quantidades de maconha para uso pessoal deve ser considerada crime. No caso, uma pessoa foi condenada à pena de prestação de dois meses de serviços à comunidade por portar 3 gramas de maconha para consumo próprio. A Lei nº 11.343/2006 (Lei de Drogas) estabelece que o uso de drogas é crime, mas não prevê a aplicação da pena de prisão (art. 28). A Lei diz que o usuário poderá ser punido com: (i) advertência sobre os efeitos das drogas; (ii) prestação de serviços à comunidade; e (iii) medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo. O tráfico de drogas é punido com pena de prisão (art. 33)

QUESTÕES JURÍDICAS

        1. A posse de pequena quantidade de maconha deve ser considerada crime?

        2. Qual critério deve ser usado para diferenciar os usuários de maconha dos traficantes?

FUNDAMENTOS DA DECISÃO

        1. O STF decidiu que ter pequenas quantidades de maconha para uso pessoal (40 gramas ou 6 pés) continua sendo proibido, mas não é crime. Por isso, no caso analisado, a pessoa condenada pela posse de 3 gramas de maconha para consumo próprio foi absolvida do crime. A decisão se baseia nos direitos à privacidade e à liberdade individual (art. 5º, X, da Constituição). Reconhece, ainda, que tratar o uso de maconha como crime incentiva atividades criminosas associadas ao tráfico, mas não reduz o consumo

        2. Se uma pessoa for flagrada usando maconha, a droga será apreendida. As medidas de advertência e comparecimento a programa ou curso educativo, previstas no art. 28 da Lei de Drogas, continuarão a ser aplicadas como sanções administrativas, sem produzir efeitos penais. Por exemplo: a pessoa que for pega usando maconha não terá registro na ficha criminal.

        3. Como a Lei de Drogas não definiu a quantidade de maconha que caracteriza consumo pessoal, atualmente, a Polícia, o Ministério Público e o Poder Judiciário avaliam em cada caso se os acusados devem ser considerados usuários ou traficantes. A ausência de um critério preciso faz com que a lei seja aplicada de forma desigual. Enquanto jovens brancos e de classe média têm chances maiores de serem considerados usuários, é mais comum que jovens pobres, negros e pardos sejam considerados traficantes. Para evitar isso, o STF definiu um critério claro e objetivo: como regra geral, quem estiver com até 40 gramas ou 6 pés de maconha deve ser considerado usuário. Essa regra valerá até que o Congresso Nacional crie uma nova lei sobre o assunto.

         4. Esse critério não é absoluto, mas uma presunção relativa que pode ser afastada se ficar provado que a droga não seria usada para consumo próprio. Por exemplo: se uma pessoa for encontrada pela polícia com menos de 40 gramas de maconha, mas estiver com embalagens, balanças ou registros de venda, poderá ser presa em flagrante por tráfico.

         5. O consumo de drogas é algo ruim e deve ser desestimulado. Por isso, o governo deve criar programas educativos para esclarecer os riscos do uso de drogas e fornecer tratamento de saúde para os dependentes. Além disso, deve criar órgãos com especialistas em saúde pública para aplicar medidas de apoio aos usuários.

(Foto: Andressa Anholete/STF).

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